Metade das populações desses grupos têm até 25 anos e 31 anos, respectivamente, ante 35 da população geral. Diferença é ainda maior dentro dos territórios próprios desses grupos. Maior quantidade de filhos por mulher pode ser uma das causas, diz pesquisadora do IBGE.
As populações indígena e quilombola são mais jovens que o conjunto dos brasileiros, segundo dados do Censo 2022 divulgados nesta sexta-feira (3) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) .
De acordo com os dados
- Metade da população brasileira tem até 35 anos;
- Entre os indígenas, metade têm até 25 anos;
- Entre os quilombolas, metade têm até 31 anos.
Além disso, a proporção de idosos em relação ao total da população – o chamado índice de envelhecimento – é menor entre os indígenas e quilombolas na comparação com o total dos brasileiros:
- No geral, o Brasil tem 80 idosos (60 anos ou mais) para cada 100 jovens de até 14 anos;
- Entre os indígenas, são 35 idosos para cada 100;
- E entre os quilombolas, 54 para cada 100.
O Brasil tem 1,7 milhão de indígenas e 1,3 milhão de quilombolas, que representam respectivamente representam 0,8% e 0,65% da população total (203 milhões).
‘Entendimento da importância de ter filhos’
Uma das possíveis razões para que as populações indígenas e quilombolas sejam mais jovens é a percepção da relevância de ter filhos para perpetuar as comunidades, segundo Marta Antunes, responsável pelo projeto de Povos e Comunidades Tradicionais no IBGE.
“A principal razão tem a ver com a dimensão cultural da relação com a reprodução física como parte da reprodução social desses povos indígenas. O entendimento da importância de ter filhos, a importância dos mais jovens nessa reposição da população e da transmissão do conhecimento.”
Segundo Antunes, dados de censos anteriores indicam que a fecunidade (quantidade de filhos por mulher) é historicamente mais elevada entre essas populações – os dados desse indicador levantados no Censo de 2022 ainda não foram divulgados.
“A gente ainda não tem esse dado [de fecundidade], mas pela análise das pirâmides etárias e comparando os dados com 2010, a gente percebe que há fecundidades mais elevadas, sim, ao longo dos últimos 15 anos, 20 anos, 30 anos. Então continua com uma fecundidade [na população indígena] mais alta do que a da população brasileira, principalmente dentro das terras indígenas (TIs)”, diz a pesquisadora.
Indígenas de várias etnias que participam do Acampamento Terra Livre 2024 marcham na Esplanada dos Ministérios em abril deste ano. — Foto: Rafa Neddermeyer/ Agência Brasil
Indígenas e quilombolas são ainda mais jovens dentro dos territórios demarcados
Segundo o Censo 2022, os indígenas e quilombolas são ainda mais jovens dentro dos próprios territórios: nas Terras Indígenas, metade tem até 19 anos (ante 30 fora delas); nos territórios quilombolas demarcados, metade tem até 28 anos (ante 31 fora).
Para Marta Antunes, os territórios demarcados garantem uma segurança maior para esses grupos sociais, o que facilita ter filhos.
“Há a questão de que quando você tem uma população dentro de um território indígena já com alguma segurança territorial, com acesso às políticas públicas, você também tem mais oportunidades sociais e econômicas para a própria reprodução física da vida. Então você pode fazer escolhas sobre a reprodução da sua família”, diz Antunes.
Essa segurança também faz com que, dentro dos territórios, não ocorra a redução na proporção de homens em relação a mulheres que acontece no conjunto da população a partir, principalmente dos 19 anos, e que decorre da maior exposição deles a fatores externos, como violência.
Criança sendo batizada na capela do Vão de Almas, no Quilombo Kalunga, em foto de 2019. — Foto: Fábio Tito/G1
Mulheres dentro e fora das terras indígenas
Apesar de as mulheres serem maioria entre indígenas de forma geral, dentro dos territórios elas são minoria.
Uma das possíveis razões para isso é a mortalidade materna, segundo Antunes. Pela maior segurança dentro dos territórios demarcados e pela maior facilidade em se planejar a gravidez, as mulheres indígenas podem ter mais filhos por mais tempo e por causa disso, as gestações se tornam mais arriscadas.
“O que os demógrafos de saúde nos apontaram, quando levamos essas questões para eles, é que a partir dos 35, 40 anos, essas gestações começam a ter um maior risco de morte por hemorragia na hora do parto ou complicações, porque já houveram várias gestações e a mulher está em uma idade mais avançada”, afirmou.
Antunes diz ainda que dentro das terras, o acesso à saúde de maior complexidade, a retirada de pacientes em situações de emergência pode ser mais difícil, inclusive por causa de questões logísticas envolvidas no acesso às terras indígenas.
Outra possível razão para haver menos mulheres dentro dos territórios é a migração das mais jovens do grupo para fora das terras indígenas.
“Ainda não temos os dados de migração para dizer quanto há de migração para fora dos territórios. [Os dados apontam] para a possibilidade de haver alguma migração, sim, mas isso precisa ser verificado. São múltiplas as razões que levam qualquer pessoa a migrar. Tem a ver com oportunidades, acesso a serviços, acesso à educação. Isso chama muito o jovem adulto indígena”, diz Antunes.
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Em 2022, o número de indígenas foi 89% maior que o observado no Censo de 2010. Houve mudança no mapeamento e na metodologia da pesquisa entre as duas pesquisas, o que permitiu identificar mais pessoas.
Os povos indígenas passaram a ser mapeados pelo IBGE em 1991, com base na autodeclaração no quesito cor ou raça.
No entanto, a partir do Censo de 2022, o instituto ampliou a metodologia, incluindo também o quesito se considera indígena para contagem da população. Houve também participação das próprias lideranças das comunidades no processo de coleta de dados e a inclusão de outras localidades indígenas além das terras oficialmente delimitadas.
Segundo Marta Antunes, entretanto, houve também um crescimento real da população, embora o envelhecimento não ocorra no mesmo ritmo do conjunto da população.
“Os indígenas estão crescendo. Dentro das terras, estão crescendo muito: 16,6% de aumento de pessoas indígenas dentro de Terras Indígenas entre 2010 e 2022. Tem muito jovem nascendo” e realmente não estão chegando nessa nessa idade de 60 ou mais com o mesma pujança que você chega na população como um todo.”
Para Antunes, a estrutura de atendimento à saúde melhor faz com que haja uma população mais idosa fora do que dentro das TIs.
Outras divulgações do Censo 2022
As informações do Censo 2022 começaram a ser divulgadas em junho de 2023. Desde então, foi possível saber que:
- O Brasil tem 203 milhões de habitantes, número menor do que era estimado pelas projeções iniciais;
- O país segue se tornando cada vez mais feminino e mais velho. A idade mediana do brasileiro passou de 29 anos (em 2010) para 35 anos (em 2022). Isso significa que metade da população tem até 35 anos, e a outra metade é mais velha que isso. Há cerca de 104,5 milhões de mulheres, 51,5% do total de brasileiros;
- 1,3 milhão de pessoas se identificam como quilombolas (0,65% do total) – foi a primeira vez na História em que o Censo incluiu em seus questionários perguntas para identificar esse grupo;
- O número de indígenas cresceu 89%, para 1,7 milhão, em relação ao Censo de 2010. Isso pode ser explicado pela mudança no mapeamento e na metodologia da pesquisa para os povos indígenas, que permitiu identificar mais pessoas;
- Pela primeira vez, os brasileiros se declararam mais pardos que brancos, e a população preta cresceu.
- Também pela primeira vez, o instituto mapeou todas as coordenadas geográficas e os tipos de edificações que compõem os 111 milhões de endereços do país, e constatou que o Brasil tem mais templos religiosos do que hospitais e escolas juntos.
- Após 50 anos, o termo favela voltou a ser usado no Censo.
- O Brasil tinha, em 2022, 49 milhões de pessoas vivendo em lares sem descarte adequado de esgoto. Esse número equivale a 24% da população brasileira. Já a falta de um abastecimento adequado de água atingia 6,2 milhões de brasileiros.
- O Censo 2022 também mostrou que mais da metade da população brasileira vive a até 150 km do litoral.