Pela primeira vez, um número expressivo de mulheres negras passa para a segunda fase do concurso para o Ministério Público do trabalho (MPT). A vitória ainda não está completa porque depende da aprovação definitiva para o cargo, mas já há motivos para comemorar.
O Coletivo Tecendo a Diversidade é uma iniciativa pensada por Procuradoras do Trabalho que tem por objetivo apoiar candidatas negras e ainda não financeiramente estáveis na busca pela sonhada aprovação no concurso para Procuradora do Trabalho. A quantidade de negros que ocupam o cargo dentro da Ministério Público do Trabalho(MPT) é muito pequena, e de mulheres negras menor ainda, apesar da implementação do sistema de cotas no concurso para membro, no percentual de 20%, desde 2017. No primeiro concurso com cotas, dos trinta aprovados, apenas um era negro e cotista, no segundo concurso foram aprovados três cotistas, de um total de quarenta, sendo duas mulheres negras, alunas do Coletivo Tecendo a Diversidade, número melhor que o anterior, mas ainda abaixo dos 20% previstos na norma. Nessa primeira fase do concurso atual, 22 mulheres negras do Coletivo Tecendo a Diversidade foram aprovadas, só elas já representam 5,5% dos candidatos aprovados para a segunda fase (401 no total). Isso, fora outras mulheres e homens negros que também passaram para a segunda fase.
Em2017, o Ministério Público do Trabalho (MPT) realizou seu primeiro concurso para membros e membras, reservando o percentual de 20% das vagas para pessoas negras (Edital do 20º Concurso – nº 136/2017). No entanto, ao final do certame, restou aprovado apenas um único candidato negro.
O Coletivo Tecendo a Diversidade foi criado por um grupo voluntário e independente de Procuradoras do Trabalho em julho de 2019, para pensar medidas e buscar soluções que pudessem facilitar a aprovação de mulheres negras no concurso da instituição.
Atualmente, o coletivo de mulheres é composto por Procuradoras do Trabalho e por mais de uma centena de alunas que são juristas negras e indígenas que sonham com o ingresso no Ministério Público, além de, nesse momento, terem sido abertas vagas para juristas quilombolas e juristas transexuais, que estejam cursando os últimos semestres de direito e tenham interesse em atuar com a promoção de justiça e direitos sociais.
No sistema de justiça, dificilmente mulheres negras são vistas ocupando cargos de poder, como o de juíza e procuradora. Especificamente sobre o MPT, de acordo com o censo interno elaborado no ano de 2021, integram a carreira de membros e membras um total de 769 pessoas, entre estas 395 homens e 374 mulheres. No cargo inicial da carreira – Procurador/a do Trabalho – são 309 homens e 300 mulheres. Em relação à composição étnico-racial, no conjunto dos cargos de membros/membras, verificamos, a partir dos dados gerais um total de 18,3% de negros (pretos e pardos). Apenas nove pessoas (1,3%) se autodeclaram pretas na instituição. O estudo não realizou recorte de gênero/raça, assim não há como aferir o total de mulheres negras, mas tomando por base o recorte de gênero, a estimativa é que sejam por volta de 8% de mulheres negras. O maior objetivo é mudar essa realidade, já que a presença de mulheres negras, periféricas, trans, indígenas, lésbicas e etc. nos espaços de decisão e poder promoverá a superação dos mecanismos ideológicos que privam essas mulheres do exercício de suas capacidades intelectuais e jurídicas e do acesso a democracia substancial.
O Ministério Público do Trabalho deve ser cada vez mais um ambiente mais democrático, mais colorido, mais inclusivo e plural. A necessidade de pessoas negras nas instituições do sistema de justiça vai muito além da representatividade, passa pela possibilidade de perspectivas negras e subalternas passem a disputar espaço, o que tem o condão de impactar profundamente na forma de atuação do MP brasileiro, trazendo efetividade democrática ao sistema.
As ações afirmativas são fundamentais para o enfrentamento do racismo estrutural, que permeia as instituições no Brasil, e termina por reproduzir práticas racistas, naturalizadas na sociedade, também no sistema de Justiça, seja pela falta de representatividade negra, seja pela própria aplicação do Direito com referências eurocêntricas, tidas como universais, ou seja pelo silenciamento sobre as questões raciais nas práticas institucionais. O Àwúre, iniciativa do MPT, da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), entende que a participação de pessoas pretas, periféricas, indígenas, transgêneros, principalmente mulheres, no sistema de justiça, ocupando cargos de poder e decisão vai muito além de representatividade. O impacto disso se reflete em toda a sociedade e nas mudanças necessárias que o Àwúre acredita.