Para especialistas, PL da Devastação levaria a retrocesso significativo na proteção ambiental; ruralistas tentam retomar na MP os pontos vetados
Os vetos do presidente Lula ao PL da Devastação, que flexibiliza o licenciamento ambiental no Brasil, ganharam o apoio de um grupo de peritos da ONU. O texto originalmente aprovado pelo Congresso Nacional representaria um retrocesso significativo na proteção ambiental, ressaltaram os especialistas em nota divulgada na última 5a feira (4/9), e que os vetos reforçam o “compromisso do Brasil em executar suas obrigações internacionais em matérias de meio ambiente e Direitos Humanos”.
Além dos peritos da ONU, bispos católicos da Amazônia brasileira também divulgaram uma carta com preocupações com o desmonte do licenciamento ambiental. De acordo com o documento, a revogação dos vetos significa uma tragédia para a Amazônia. Os religiosos citaram as encíclicas Laudato Si’ e a Laudato Deum, esta última assinada pelo Papa Francisco em 2023. “Na realidade, falta um verdadeiro interesse pelo futuro destas pessoas [impactadas], porque não lhes é dito claramente que, na sequência de tal projeto, terão uma terra devastada”, disse o documento.
O coro contra o PL da Devastação também ganhou apoio do jornal O Globo. Em editorial, o veículo atacou a posição da bancada ruralista que, ao invés de zelar pelo futuro do agronegócio, tem atuado com persistência em favor do atraso nas pautas ambientais, sabotando seus próprios interesses. “Quando o Brasil é criticado em fóruns internacionais pela devastação do meio ambiente, muitas lideranças do setor rapidamente se dizem injustiçadas e argumentam, com razão, que os destruidores são uma minoria. Mas a defesa renhida da bancada ruralista à agenda dos devastadores põe em xeque as credenciais verdes do agronegócio”, enfatizou o jornal.
Entretanto, a despeito das críticas, a aliança entre ruralistas, bolsonaristas e Centrão segue se articulando para restabelecer o texto original do PL da Devastação. Segundo o Valor, um dos alvos é a Medida Provisória publicada pelo governo federal para criar a Licença Ambiental Especial (LAE).
Os parlamentares propuseram mais de 830 emendas à MP que praticamente restabelecem os pontos vetados por Lula no PL, como a Licença Ambiental por Adesão e Compromisso (LAC) para projetos de médio impacto ambiental; a dispensa de licença para produtores rurais com Cadastro Ambiental Rural (CAR) ainda pendente de análise por órgãos ambientais; e a retirada de órgãos como a FUNAI dos processos de licenciamento em áreas não demarcadas.
A bancada ruralista também vem cobrando do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), a colocação da revisão dos vetos em pauta. O líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (PT-AP), admite a dificuldade que o governo terá em conseguir os votos necessários para impedir a derrubada dos vetos, mas lembra da possibilidade de judicializar o caso.
- Em tempo: As pressões orçamentárias e a dificuldade política do governo no Congresso também atrapalham os esforços de proteção ambiental. O ICL trouxe a situação do quadro funcional dos órgãos ambientais federais: em 2009, o país tinha cerca de 1,8 mil agentes ambientais; em 2021, esse número era de apenas 630, uma queda de 65% em pouco mais de uma década. Hoje, esse número subiu para 771, mas segue distante da capacidade necessária. A Associação Nacional dos Servidores da Carreira de Especialista em Meio Ambiente (ASCEMA Nacional) protocolou em Brasília uma carta aberta solicitando a nomeação antes da COP30 de todos os aprovados recentemente nos concursos do ICMBio e IBAMA. “O governo [federal] tem disposição política para retomar, mas a reconstrução se faz com pessoal, equipe técnica e presença nos territórios, não apenas com seminários ou reuniões”, afirma Tânia Maria de Souza, presidenta da ASCEMA.
Antonio Cruz/ Agência Brasil