Exú, Oxóssi e Oxum são os Orixás regentes de 2023. Isso indica que este é um ano propício à realização de grandes projetos em que sejam colocadas força própria de trabalho, garra e exposição. E já dando início nessa regência, no primeiro mês do ano, foram sancionados no Congresso Nacional Brasileiro projetos de enorme importância para as religiões de matizes africanas e outras conquistas também aconteceram na esfera do executivo federal.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, criou o Ministério da Igualdade Racial, comandado por Anielle Franco, que tomou posse do cargo em 11 de janeiro. O ministério conta com a Secretaria de Políticas para Quilombolas, Povos e Comunidades Tradicionais de Matriz Africana e Ciganos, coordenada pelo secretário Ronaldo Santos, quilombola do Rio de Janeiro.
Demonstrando respeito à diversidade religiosa e cultural, Lula sancionou a Lei 14.519/2023, que institui o Dia Nacional das Tradições das Raízes de Matrizes Africanas e Nações do Candomblé, a ser comemorado anualmente no dia 21 de março. O texto também foi sancionado e assinado pelas ministras da Cultura, Margareth Menezes, e da Igualdade Racial, Anielle Franco.
Sabemos que as religiões de matriz africana já sofrearam (e ainda sofrem) muita discriminação, perseguição, racismo e intolerância ao longo da história do nosso país, essas perseguições se intensificaram desastrosamente nos últimos 4 anos. Segundo dados do Ministério dos Direitos Humanos, só em 2022 foram 1.200 ataques – um aumento de 45% em relação a 2020.
Para punir quem comete crimes religiosos e ajudar a proteger as vítimas, outra lei sancionada pelo presidente Lula foi a que equipara o crime de injúria racial ao crime de racismo, e também protege a liberdade religiosa. Agora, a lei prevê pena de 2 a 5 anos para quem impedir ou utilizar a violência contra quaisquer manifestação ou práticas religiosas. A pena será aumentada na metade se o crime for cometido por duas ou mais pessoas, além de pagamento de multa. Antes, a lei previa pena de 1 a 3 anos de reclusão.
Adeptos de religiões de matrizes africanas como (Umbanda e Candomblé) acreditam e esperam que esse marco histórico diminua o preconceito e dê mais segurança aos rituais e liturgias.
A gestora de projetos, Irina Bacci é candomblecista e comenta sobre o estigma e discriminação que as religiões e as pessoas de matriz africana sofrem.

“Muito do estigma, das intolerâncias, da discriminação que as religiões e as pessoas de matriz africana sofrem é pautado no racismo. Assim, ter no mesmo dia, a luta internacional contra a discriminação racial e o dia nacional das tradições das matrizes africanas e nações do candomblé impulsionam a importância de que a intolerância contra as religiões é um racismo religioso. Vejo com isso, a importância para que a sociedade brasileira debata de maneira franca e honesta o reconhecimento da influência das religiões de matrizes africanas em nossa cultura, na música, na culinária, nas nossas roupas, vocabulários, superstições e se orgulhar de nossas origens. Essa data ajudará o Brasil a reconhecer a cultura afro como elemento central da nossa formação cultural e ancestral”.
Irina ressalta a importância deste dia.
“A data é importantíssima, porque colocará a sociedade para debater, dialogar e sobretudo, valorizar as manifestações religiosas de matrizes africanas como parte da diversidade religiosa brasileira, promovendo uma ampla difusão e conscientização”.
José de Almeida Filho, é natural de Piracicaba (SP), conhecido como Mestre Zequinha no universo da Capoeira. Filho de mãe preta, mineira, que criou sozinha três filhos na periferia da cidade. Zequinha foi católico até seus 15 anos, pois sua mãe era muito católica e ele a acompanhava aos domingos de missa. Mas foi através da prática da Capoeira que ele foi deixando de frequentar as missas, e por ir conhecendo a real história sobre o povo preto, que na escola não se ensina, que ele se encontrou no candomblé.

“Fui para Bahia e conheci e me apaixonei pelo Candomblé. Tive a honra de conhecer Mãe Stella de Oxóssi , do Terreiro Ilê Axé Opô Afonjá e Mãe Ilza Mukalê, do terreiro de candomblé Matamba Tombeci Neto, localizado na cidade de Ilhéus, Bahia”.
Zequinha recebeu com muita alegria a notícia que o presidente Lula sancionou a Lei 14.519/2023.
“Olha, quando recebi a notícia que o presidente Lula tinha sancionado a Lei, fiquei muito feliz, pois cada avanço que damos é motivo de comemorar. Eu fui logo conferir no Diário oficial da União para não repassar notícia falsa. Cada posso que avançamos e que nos dão visibilidade ou que dá visibilidade para o povo de terreiro é motivo de alegria para mim e para todo nosso povo preto e principalmente para nossa gente de tradições e raízes de matrizes africanas”.
Porém, mestre Zequinha se questionou: “será que é só mais uma Lei que não vai funcionar?”.
“Vejo que essas leis são de estrema importância, desde que elas funcionem, que as pessoas respeitem e façam valer, não estamos pedindo nada, só queremos viver e exercemos nossas funções com dignidade, seja eu na Capoeira ou a Ialorixá, o babalorixá no candomblé ou tantos outros Mestres da nossa cultura”.
“Eu acredito muito nesse governo e esses ministros: Silvio Almeida – Direitos humanos, Margareth Menezes – Cultura e Anielle Franco- Igualdade Racial,- têm tudo para dar certo. A intolerância religiosa é inaceitável. Nas redes sociais e no presencial, como aconteceu recentemente em Vitória da Conquista, o Cidão se é que posso chamá-lo assim, entrou e destruiu tudo que encontrou pela frente no terreiro, ele foi pego, confessou e não foi preso, isso tem que acabar. Seria fundamental que essa educação começasse em casa com nossas crianças, que os educadores ensinem nas escolas para que as crianças cresçam com essa conscientização e venham respeitar as diferenças. Só assim essas Leis serão respeitadas e será satisfatória para todos nós” afirmou.
Uma das ações do Àwúre, projeto de iniciativa do MPT, Organização Internacional do Trabalho (OIT) e do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), é o combate a Intolerância religiosa; por isso, existe o “Àwúre Terreiros”, iniciativa em que se realiza estudos para a compreensão da religiosidade, história, tradição e cultura ancestrais dos povos e comunidades tradicionais de terreiro de matriz africana de culto a orixás, voduns, nkisses, e outros, para contribuir com o rompimento dos estigmas e preconceitos que envolvem as religiões de matriz africana e, consequentemente, promover o combate à violência e intolerância religiosa, valorização da cultura, história e tradições dessas comunidades.
Através do Àwúre Terreiros se mapeia de casos de discriminação praticada contra trabalhadoras e trabalhadores de religiões de matriz africana e elaboração e divulgação de campanhas para valorização da pluralidade cultural das comunidades tradicionais de terreiro.
Nesse combate aos casos de discriminação, foi lançado em 2021, durante o Seminário “Direitos Humanos Fundamentais dos Povos e Comunidades Tradicionais de Terreiros de Religiões de Matriz Africana, a campanha “Violência não combina com fé”. Um chamado à reflexão sobre as violências – físicas e morais- praticadas contra algumas religiões, principalmente a dos povos originários e comunidades tradicionais, entre eles, as comunidades de religiões de matriz africana. A campanha busca prevenir e combater o racismo religioso e afirmar o direito à liberdade religiosa.
O Awúre busca promover o respeito a todas as religiões. Viva a liberdade religiosa! Viva o estado laico! Axé para quem é de axé, Saravá para quem é de saravá, amém para quem é de amém. Mas o RESPEITO é para todas, todes e todos.