Fevereiro, o mês do Carnaval – a maior festa popular do Brasil, em que há muita alegria, música, diversão. Aproveitando a forte influência da música, o Àwúre, iniciativa do Ministério Público do Trabalho (MPT), Organização Internacional do Trabalho (OIT) e UNICEF Brasil – Fundo das Nações Unidas para a Infância, abre espaço para artistas que fazem parte das populações e temáticas abordadas pelo Canal. Nesse espaço, artistas falam sobre o trabalho e a luta para se destacarem no cenário musical.
Em entrevista para o Àwúre, o cantor, compositor e produtor musical, Edivan Fulni-ô fala sobre seu papel como artista e que busca transmitir.
Indígena nordestino que permeia universos artísticos e cosmológicos a partir do entendimento de sua própria narrativa identitária, fruto da confluência histórica indígena e afro-diaspórica. Um cidadão indígena pertencente a um povo tradicional cujos costumes e organização social são próprios.
Tendo em vista um país indígena, onde identidades foram soterradas, apagadas, invisibilizadas pelo colonialismo, seu papel enquanto artista indígena é despertar consciências dos seus que ainda tem suas ancestralidades adormecidas e busca também o fortalecimento do coletivo.
“Demarcar corações é manter nossos ancestrais vivos”- Edivan Fulni-ô
Àwúre: Como começou seu envolvimento com a música, e quando você se reconheceu como artista?
Edivan: Ainda na aldeia, quando criança, ouvia cantos tradicionais de Pataxó-hã-hã-hãe e Fulni-ô. É comum em toda comunidade indígena a presença da música em toré, cafurnas e outras manifestações culturais. Já em casa, ouvi bastante rádio e, quando adolescente, músicas no YouTube. Experiências sonoras que vieram moldando meu imaginário musical.
Minha mãe Mercy (sim, o nome dela é Mercy, de influência colonial europeia), mulher indígena Fulni-ô, me passou o dom do violão. Foi meu principal incentivo na imersão musical. Ter um violão e uma professora em casa abrem portas. Já na universidade tive minhas primeiras experiências musicais que fizeram me enxergar músico, e alguns anos depois, artista.
Ainda na universidade fui mesclando e entendendo tudo como um só, que Identidade, arte, política e profissão podem e devem andar juntas. Vamos percebendo nossas próprias potências, dons e sonhos durante a caminhada, já que o mundo prevê, para corpos como o meu, o apagamento, morte ou servidão. Política, identidade e sonhos são temas tirados de nós a todo instante. Seguimos sendo artistas na luta pela vida.
Àwúre: Em suas canções você entra em assuntos como política, resistência, genocídio e ancestralidade. Fale mais sobre a importância de se expressar através da arte falando sobre esses assuntos.
Edivan: Essa terra hoje chamada Brasil, sempre foi banhada por cantos, batuques, plumagens e adereços. Nós, povos tradicionais e originários, temos a arte como forma de comunicação. Nós somos a própria arte. A arte do cantar, do vestir, do dançar. A arte de lutar. Tudo isso é nossa fala. E temos que falar das coisas que nos afeta, nos mata, nossa história e quem somos. Não é de hoje que povos indígenas são invisibilizados. Nossas formas de ser e viver são vistas como um empecilho ao progresso. Por muito tempo o mercado da arte vem se sustentando na alienação do povo. E já está mais que na hora de ocuparmos palcos falando de nós mesmos, da mãe terra e de como segurar o céu.
Àwúre: A personalidade de uma pessoa que toca ou canta é refletida através da música? Fale-nos um pouco sobre isso?
Edivan: Sim. Nossas crenças, sonhos, alegrias e medos são refletidas por quem se vê na mesma luta. Isso é incrível, pois nós, artistas indígenas, falamos uma linguagem coletiva, uma só voz. Por outro lado, cada artista tem sua história de vida pessoal. Um lado B de nossa personalidade onde só conhece quem está perto e presente no corre de todo dia. A internet nunca vai comunicar nosso ser em totalidade. Em um mundo perverso queremos mostrar apenas nosso lado mais forte.
Àwúre: Fique à vontade para falar algo que eu não perguntei e que você gostaria de ter dito.
Edivan: O caminho é o retorno à terra e autonomia de nossos povos. Devemos pensar, articular e realizar ações em prol de nossa independência ao sistema que nos mata.
Agradeço ao querido Pedro Lemos e ao Àwúre pelo convite para esta entrevista. Me sigam nas redes sociais @edivanfulnio. #retomada
Quem quiser conhecer um pouco da arte de Edivan, abaixo estão os links de algumas de suas músicas:
Clipe: Não sou Índio pra gringo ver: https://youtube.com/watch?v=Sp5TMgXbxjo&si=EnSIkaIECMiOmarE
EP COMPLETO – Segura na minha mão: https://youtube.com/watch?v=mQfXPqI9p2Q&si=EnSIkaIECMiOmarE
O Àwúre festeja e aplaude a diversidade em todas as áreas, inclusive na música!