De acordo com dados da Abrelpe (Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais), no ano de 2021, o Brasil alcançou a marca de 82,5 milhões de toneladas de resíduos sólidos urbanos, ou 225.965 toneladas diárias. Com isso, cada brasileiro gerou, em média, 1,07 kg de resíduo por dia. Os recursos aplicados pelos municípios nos serviços públicos de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos urbanos, alcançaram R$ 27,3 bilhões no ano de 2021. A região com maior geração de resíduos continua sendo a Sudeste, aproximadamente 113 mil toneladas diárias, 460 kg anualmente por habitante. Atualmente existem cerca de 800 mil profissionais catadores de resíduos sólidos urbanos em atividade no Brasil, e uma média de 1.700 cooperativas em atividade. De acordo com o Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR), as mulheres são maioria entre os catadores de materiais recicláveis, representando 70% dos 800 mil trabalhadores em atividade no Brasil.
A procuradora do Ministério Público do Trabalho, Elisiane dos Santos é uma das idealizadoras do livro Quarentena da Resistência. O livro foi escrito por agentes ambientais, também conhecidos como catadoras de lixo reciclável. O projeto mostra iniciativas promovidas em parceria entre a Organização Internacional do Trabalho (OIT) e o Ministério Público do Trabalho (MPT) que buscam assegurar condições dignas para os trabalhadores em situação de vulnerabilidade.
“A cada 4 catadores, 3 são mulheres, 90% são negros e apenas 10% por cento estão organizados em cooperativas. Podemos enxergar aqui um perfil de mulheres, mulheres negras que em sua grande maioria estão realizando uma atividade de forma precarizada. Quando falamos das catadoras de material recicláveis, já estamos pensando em uma categoria de profissionais que realizam uma atividade que é essencial para a vida humana, que é essencial para o meio ambiente e que lamentavelmente ainda é pouco valorizado pela sociedade brasileira. Talvez por um desconhecimento e também por uma ausência de cultura de educação ambiental desde a infância”. Destaca a Procuradora.
Dentro dessa realidade, surgem histórias de força e superação. Em sua imensa maioria, histórias vividas por mulheres que através da reciclagem conseguiram se estabelecer como profissionais e principais provedoras do lar. Cristiane Pereira é uma das fundadoras da Cooperativa Recicla Mais Brasil. Ela e seu marido, antes da cooperativa, seguiam pelas ruas da capital federal com seu “carrinho” buscando e selecionando os matérias que seriam destinados a coleta seletiva. “Quando íamos fazer a coleta, as pessoas falavam que se estivéssemos juntos, com outras pessoas, o trabalho seria melhor. Hoje a cooperativa tem mais de 10 anos de existência, somos 68 catadores e aproximadamente 70% são mulheres.” Destaca Cristiane. “A maioria que vem nos procurar são mulheres. Mães de família, solteiras com filhos pedindo oportunidades. Mulheres que são pai e mãe, que são o pilar principal do seu lar.” acrescenta.
Ediely Carla é mãe solo, tem 22 anos, mora com a mãe e tem uma filha de 2 anos. Sem trabalho por conta da pandemia, Ediely encontrou na reciclagem uma solução para sua situação de vulnerabilidade. “Eu encontrei uma oportunidade aqui. Cheguei aqui através de um amigo, fui indicada, estava parada. Eu cheguei pra ajudar mesmo. Eu não conhecia o trabalha das catadoras, quando cheguei aqui me surpreendi. Tudo muito organizado. A gente achava que era uma coisa e na verdade era outra. Aqui eu me senti realizada.”
As adversidades fazem parte dessa classe e muitos catadores permaneceram na ativa durante a pandemia. Outros tiveram seu primeiro contato com a reciclagem durante esse período. Emily tem 21 anos e um filho de um ano e seis meses. Desempregada, LGBTQI+ e com depressão, encontrou trabalho na cooperativa e foi aceita mesmo revelando que ainda sofria e que a qualquer momento poderia vir a ter uma crise. “Eu não estava bem, fui embora da minha cidade, larguei tudo, larguei meu serviço. Aí vim aqui pra Brasília. Estava muito difícil para conseguir algum serviço. Um amigo meu falou sobre a Recicla, falou sobre as oportunidades que eles ofereciam. No momento que cheguei, demorou cinco dias eu fui chamada, fiz a entrevista, falei o que estava acontecendo comigo que não estava bem, mesmo assim eles me acolheram.”
No Brasil, a Lei nº 12.305, de agosto de 2010, instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS). A Lei reconhece a atuação de catadores e a catadoras de lixo reciclável como agentes imprescindíveis à gestão dos resíduos sólidos. O trabalho desenvolvido pelos catadores(as) de materiais recicláveis só traz benefícios para todos. O processo de reciclagem reduz a poluição do solo, da água e do ar, além de colaborar com a redução da emissão de GEE (gases de efeito estufa. Combater a invisibilidade social sofrida por esses trabalhadores tão importantes faz parte das ações do Projeto Àwúre. O Àwúre é uma iniciativa do Ministério Público do Trabalho, Organização Internacional do Trabalho e Fundo das Nações Unidas para a Infância reforça a importância do respeito a todas as religiões e culturas e também do resgate em trabalhar a pluralidade do nosso país.