“O principal desafio enfrentado pelas trabalhadoras domésticas, é o desafio do não cumprimento da lei por grande parte dos patrões. O nosso maior desafio é a informalidade”. Luiza Batista Pereira é presidenta da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas (Fenatrad). Suas palavras revelam a realidade de milhares de trabalhadoras domesticas espalhadas pelo país. Das quase cinco milhões de pessoas que trabalham com limpeza ou similar no Brasil, quatro milhões e meio são mulheres. Um milhão e meio desses (as) trabalhadores(as)são negros(as). Desse total, menos de um terço possui carteira assinada. De acordo com dados do PNAD Contínua, 1,5 milhão de postos de trabalho doméstico foram perdidos no período de 2019 – 2020.

“Mesmo com direito à carteira assinada, com a lei aprovada em dezembro de 1972, e que entrou em vigor em 8 de abril de 1973, que foi o primeiro direito que conquistamos, tanto tempo depois, mesmo com todos os avanços, ainda tem a questão de não termos sequer 45% do total de trabalhadoras e trabalhadores com registro na carteira”, destaca Luiza. Durante a pandemia, essas trabalhadoras foram consideradas “trabalhadoras essenciais em algumas regiões, o que fez a categoria entender a diferença entre essencial e valorização.

“Durante a pandemia, realizamos algumas campanhas de conscientização em resposta aos decretos de lockdown, porque alguns governadores entenderam que o trabalho doméstico era essencial durante a pandemia e a gente discordou! Porque essencial são os nossos direitos. Sabemos da importância do trabalho doméstico na vida das pessoas, porém não é valorizado. Aí chega no momento de pandemia querem ter a trabalhadora a disposição, muitos trabalhando em home office sem querer abrir mão da trabalhadora. Isso não foi uma valorização para a categoria, foram os empregadores não querendo abrir mão de ter uma pessoa a seu serviço e, em sua grande maioria, negligenciando a saúde dessas trabalhadoras. No Rio de Janeiro, a primeira morte por Covid que foi registrada foi a de uma trabalhadora doméstica idosa, com comorbidades, infectada pelos seus patrões que voltavam de uma viagem pela Europa. Ambos já contaminados, mas não se preocuparam com nossa companheira”, Relembra Luiza Batista.
A questão do trabalho análogo à escravidão também é uma realidade dessas trabalhadoras. Durante a pandemia muitas delas foram resgatadas em ações tanto do Ministério Público do Trabalho, quanto da polícia, através de denúncias.

“Muito tempo dentro de uma casa, péssimas condições de trabalho, não pagamento de salário. Teve casos que foram horrorosos. Mulheres escravizadas praticamente a vida inteira. O trabalho domestico não pode ser fiscalizado diretamente pelo sindicato, porque a Constituição fala que a residência é inviolável, pelo menos a residência de que tem uma boa conta bancaria, que tenha a pele clara, o cabelo liso. Realmente para essas pessoas, no Brasil, o lar é inviolável. Nas comunidades sabemos que não é assim”, defende Luiza ao citar casos de trabalhadoras resgatadas em diversas regiões do país. “A situação das trabalhadoras domésticas no Brasil nunca foi uma situação confortável. A carga da herança escravocrata, o Brasil colônia ainda nos dias atuais, tudo isso com uma outra roupagem.”.
“São 85 anos de luta, 48 anos que conquistamos o primeiro direito, e ainda hoje esses direitos não são respeitados da forma como devem. A Fenatrad não generaliza nessa fala porque sabemos que tem muitos patrões que assinam carteira, que respeitam, que tratam com dignidade”, finaliza.
Buscando o cumprimento dos direitos resguardados por lei das trabalhadoras domésticas, o Àwúre, através das suas ações compreende o verdadeiro valor das Trabalhadoras Domésticas em nosso país. O Àwúre, uma iniciativa do Ministério Público do Trabalho (MPT), Organização Internacional do Trabalho (OIT) e do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), vem buscando essas mudanças através do projeto que atende mais de 60 mil pessoas em 6 estados brasileiros. Uma população de indígenas e comunidades tradicionais, quilombolas, de terreiros de religiões de matriz africana, ribeirinhos (as) e de periferia.