Na semana passada, representantes do Ministério Público do Trabalho (MPT), estiveram realizando uma inspeção do Grupo de Trabalho “Povos Originários e Comunidades Tradicionais”, em Guapoy Mirim Tujury em Amambai, Mato Grosso do Sul. A atuação do MPT se deu em conformidade com a resolução 230/ 2021, do Conselho Nacional do Ministério Público, que disciplina a atuação do Ministério Público junto aos povos e comunidades tradicionais. A resolução estabelece que a atuação do Ministério Público junto aos povos e comunidades tradicionais se pautará pela observância da autonomia desses grupos e pela construção de diálogo intercultural permanente, de caráter interseccional.
No dia 24 de junho deste ano, um indígena da etnia guarani-kaiowá , Vítor Fernandes, de 42 anos, morreu a tiros e pelo menos outros 10 indígenas ficaram feridos, em uma ação de policiais do Batalhão de Policiamento de Choque em Amambai, de Mato Grosso do Sul, na região de fronteira com Paraguai. O conflito aconteceu em área reivindicada pelos indígenas. Segundo informações dos indígenas, cerca de 30 famílias de indígenas guarani-kaiowá entraram na Fazenda Borda da Mata, reivindicada por eles como sendo parte da aldeia Amambai, no território denominado Guapoy. O produtor rural teria acionado a PM e, no dia seguinte, a tropa especial foi enviada até o local.
O governo estadual do MS afirmou que três policiais também ficaram feridos e nega que tenha enviado a tropa especial da Polícia Militar para fazer reintegração de posse, já que isso seria competência da Polícia Federal.
Os indígenas contam que, além de Vitor Fernandes que morreu, mais 30 indígenas ficaram feridos, alguns de forma mais leve. O hospital da região recebeu 10 pessoas feridas: sete indígenas, sendo duas adolescentes, e mais uma mulher e quatro homens e 3 policiais, feridos nas pernas e nos pés, mas sem gravidade.
Equipes da Polícia Federal estiveram no local, onde fizeram o levantamento das informações para repassar tudo ao Ministério Público Federal. Esse conteúdo reunido também pode dar suporte para uma investigação, inquérito ou para abastecer outros órgãos. Em nota, a Polícia Federal informou que compete a eles “garantir a integridade de comunidades indígenas, quando estas se encontrarem em risco”.
Denúncias feitas pelos indígenas ao Grupo de Trabalho do MPT, dão conta que a força policial, para retirar os Guaranis e Kaiowa do local, foi usada sem nenhuma autorização do judiciário e participação dos órgãos de defesa indígena.
Na semana passada, em uma decisão histórica no estado de Mato Grosso do Sul, a Justiça Federal de Ponta Porã indeferiu um pedido para despejar os Guarani e Kaiowá da retomada de Guapo’y, em Amambai (MS). A solicitação foi feita pelo proprietário da fazenda que ocupa, atualmente, a região.
No texto da decisão, o juiz Thales Braguini Leão diz que “O fato de não existir demarcação sobre a área ou qualquer processo administrativo tendente a promovê-la não é suficiente para descaracterizar a luta pela posse das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios. O papel que a parte autora tanto exibe para cumprimento pelas leis do direito é produção humana, e de homens brancos. Naturalmente, a legitimidade dessa busca indigenista é algo a ser averiguado pelos órgãos e meios próprios. Mas não se pode, aqui, ignorar a existência de elementos que indicam a possibilidade de estarem eles litigando com seus próprios meios por aquilo que nosso sistema constitucional prometeu a eles”. O juiz complementa a decisão: “foram colhidos elementos mais do que convincentes a respeito da relevância da discussão promovida pela comunidade indígena, o que justifica pelo menos que recebam a proteção integral e atenção às suas reivindicações”. O processo continuará em andamento.
A Procuradora do Trabalho do MPT do MS, Juliana Mafra, que liderou a visita conta o que encontrou no local mais de 15 dias depois da ação policial. “ Uma criança indígena, de 13 anos, teve ferimentos sérios no abdômen, decorrentes de disparo de arma de fogo e encontra-se em recuperação.”
Juliana Mafra, disse também, que durante a inspeção, houve a entrega das doações aos Guaranis e Kaiowá, com apoio do CIMI, CPT, FAIND, UFGD. Dentre os itens havia 40 cobertores, 300 pães com mortadela, utensílios de cozinha, 40 kg de frango, linhas de lã, pano cru, tesouras (pra fazerem os traje típicos) cestas básicas, roupas, produtos de higiene e caixas de leite.

A procuradora diz quais as ações aconteceram depois da visita:
“Um relatório preliminar sobre necessidade de atendimento médico foi expedido com urgência e solicitado o atendimento junto ao Ministério da Saúde, com apoio da CODEMAT, em articulação com MPF, DPU e DPE. Foram aplicados questionários, para a verificação das condições relacionadas a outros direitos sociais, inclusive prevenção ao trabalho escravo e combate ao infantil na região.
Agradeço a todos os colaboradores, em especial ao Procurador Geral do Trabalho, José de Lima Ramos Pereira, ao Diretor-geral Gláucio Araújo de Oliveira, à Coordenadora Nacional da CONAETE, Lys Sobral Cardoso, à Procuradora Chefe, Cândice,Gabriela Arosio, ao Coordenador Regional da CONAETE e membro do GT, Jonas Ratier Moreno, a Coordenadora do GT Povos Tradicionais, Edelamare Barbosa Melo e à equipe da GSI, Sérgio Massao Hisano e Sérgio Ferreira.”
Clique aqui para acessar o relatório preliminar da visita e o pedido da Defensoria Pública da União.