O caso recente de uma mãe de santo na Paraíba evidencia como o racismo religioso segue sendo uma ferida aberta no Brasil

Intolerância religiosa ou racismo religioso?
Ambos os termos costumam ser usados como sinônimos no cotidiano, mas, na prática, e principalmente na justiça, eles não significam a mesma coisa.
Intolerância religiosa é o ato de desrespeitar, impedir ou ofender práticas de uma fé alheia à sua. Pode ser direcionada a qualquer religião, inclusive àquela que é majoritária.
Já o racismo religioso é uma forma de discriminação que atinge especificamente as religiões de matriz africana ou indígena, conectando fé, ancestralidade e raça como um só alvo de perseguição.
O racismo religioso não é apenas um ataque à crença, mas à origem étnico-racial dos povos que a sustentam. Por isso, ele deve ser nomeado corretamente, porque só assim é possível combatê-lo com as ferramentas que ele exige: políticas públicas, legislação firme e reparação histórica.
O caso da Paraíba
Recentemente, um episódio em João Pessoa reacendeu esse debate. Uma mãe de santo foi denunciada à Justiça por realizar um ritual religioso em uma área aberta, que teria gerado “barulho excessivo”. O caso chegou ao conhecimento do juiz Agliberto Gomes Machado, da 3ª Vara da Fazenda Pública da Paraíba, que, ao decidir, apontou o que muitos preferem ignorar:
“O incômodo não foi com o volume do som, mas com o som dos atabaques. Não foi com o espaço público, mas com o sagrado preto ocupando esse espaço.”
O juiz foi além e reconheceu que o que havia ali não era meramente intolerância, mas racismo religioso.
Essa decisão é simbólica e histórica porque rompe com a superficialidade com que casos assim são tratados. Não se trata apenas de “opinião” ou “liberdade de expressão”, mas de preconceito racial institucionalizado, disfarçado de argumento técnico ou jurídico.
Racismo religioso é crime!
O Projeto Àwúre nasce e se constrói a partir da escuta e da valorização dos povos originários, das comunidades quilombolas, das tradições afro-brasileiras, dos povos de terreiro e dos saberes ancestrais. Por isso, reafirmamos:
Liberdade religiosa é um direito constitucional. Mas quando esse direito é sistematicamente negado a determinadas tradições e aceito para outras, não estamos mais falando de intolerância, estamos falando de racismo.
Dar nome às coisas é o primeiro passo para enfrentá-las. E nós escolhemos chamar pelo nome certo: racismo religioso, e isso é crime.
O Àwúre seguirá denunciando, informando, fortalecendo a luta e acolhendo as vozes que insistem em ecoar mesmo quando o mundo tenta silenciá-las.
Religião não é barulho. É sagrado.
E o sagrado merece respeito.



